EM DECISÃO HISTÓRICA, ARGENTINA APROVA DIREITO DE MULHER DECIDIR SOBRE ABORTO
A decisão teve 38 votos a favor e 29 contra, além de 1 abstenção
Após uma aguardada sessão que durou 12 horas, o Senado da Argentina aprovou, no último dia 30, o direito de a mulher optar pelo aborto até a 14ª semana de gestação. A decisão histórica teve 38 votos a favor e 29 contra, além de 1 abstenção.
Até então, o procedimento era permitido em caso de estupro
ou risco de morte da mãe. Agora, a Argentina se torna o primeiro país grande da
América Latina a legalizar a interrupção da gravidez. Na região, a prática já
era autorizada em Cuba, Guiana, Guiana Francesa, Uruguai, Porto Rico, na Cidade
do México e no estado de Oaxaca -no México, esse tipo de legislação é decidido
em nível regional.
Há dois anos, durante a gestão de Mauricio Macri, um
presidente de centro-direita, um projeto de lei semelhante foi derrotado no
Senado por uma diferença de apenas sete votos. Agora, além de ter sido
vitoriosa, a proposta era uma promessa de campanha do atual líder do país,
Alberto Fernández, que certamente vai chancelar a decisão do Congresso.
"O aborto seguro, legal e gratuito é lei. Hoje somos
uma sociedade melhor, que amplia direitos às mulheres e garante a saúde
pública", escreveu o chefe de Estado argentino no Twitter.
A sessão no Senado foi comandada por Cristina Kirchner,
ex-presidente (2007-2015) e atual vice de Alberto Fernández. Cada parlamentar
tinha de 10 a 15 minutos para discursar, o que fez com que a votação ocorresse
apenas às 4h06 desta quarta, numa sessão que começou às 16h09 do dia anterior.
A proposta já havia sido aprovada pela Câmara de Deputados
no dia 11. Assim como naquela ocasião, dois acampamentos -um "verde",
cor adotada pelas favoráveis à liberação, e um "celeste", de
contrários à aprovação- foram montados do lado de fora do Congresso para
acompanhar a votação por telões.
O papa Francisco, argentino, manifestou-se: "O filho de
Deus nasceu descartado para nos dizer que toda pessoa descartada é um filho de
Deus. Veio ao mundo como um bebê vem ao mundo, débil e frágil, para que possamos
acolher nossas fragilidades com ternura".
No começo da sessão, a estimativa era de que a votação
tivesse 34 votos a favor e 32 contra, com duas ausências -as do ex-presidente
Carlos Menem (1989-1999), que está hospitalizado em estado grave, e de José Alperovich,
suspenso enquanto responde processo por assédio sexual.
Havia quatro parlamentares indecisos. Por volta das 18h30, um deles, a senadora
Silvina García Larraburu, que havia votado contra a aprovação há dois anos, fez
um discurso favorável ao projeto.
A partir daí, os "verdes" se animaram, enquanto aumentava a preocupação entre os "celestes". A frente da casa de García Larraburu logo encheu-se de manifestantes antiaborto. Logo, mais dois indecisos também indicaram voto a favor do projeto de lei, e a tendência de vitória da aprovação foi se fortalecendo.
Durante a gestão de Cristina Kirchner, a proposta pró-aborto não avançou porque a então presidente era contrária à pauta. Em 2018, já senadora, no entanto, votou a favor da legislação.
Afirmou que havia mudado de ideia por ter sido convencida pelas meninas que via abraçando a causa nas ruas, em protesto, o que, diz ela, a fez pensar no futuro de suas netas.
O projeto de lei aprovado contempla, ainda, uma cláusula para evitar judicializações, que atrasam a decisão e podem inviabilizar a realização do procedimento. De acordo com a nova regra, o aborto deve ser feito em até 10 dias depois de o pedido ter sido feito pela requerente.
Médicos poderão alegar objeção de consciência, mas terão de reportar o caso ao hospital ou centro de saúde em que trabalham e transferir a paciente a uma unidade que faça o procedimento dentro do prazo.
Paralelamente, os senadores também aprovaram o projeto dos "Mil Dias", um conjunto de políticas de contenção e assistência financeira, médica e psicológica a mulheres mais pobres que desejem continuar com a gestação, mas não têm condições de manter a gravidez.
O governo calcula que sejam realizados entre 370 mil e 520 mil abortos clandestinos por ano no país, cuja população é de 45 milhões de habitantes. Desde a restauração da democracia, em 1983, mais de 3.000 mulheres morreram devido a abortos realizados sem segurança.
Fonte: Folha / Notícias ao Minuto